"Não sei o que estou fazendo aqui,
sinceramente não sei. Devia estar louca quando concordei com a Renata de
participar do encontro anual de alunos do colégio em que estudei minha vida
inteira, onde vivi péssimos anos e ganhei alguns traumas. Mas aqui estou eu, no
canto como sempre, vendo a festa acontecer.
Não importa quanto tempo se
passe, algumas coisas não mudam mesmo. Nunca fui popular, na verdade longe
disso. Era a típica adolescente nerd, de aparelho, óculos, que sentava na
primeira carteira da primeira fileira, que só tirava ótimas notas e com um futuro
brilhante pela frente. Em muitos cenários isso não seria a formula para o
fracasso, mas estamos falando de ambiente escolar, onde ter um futuro brilhante
é o mesmo que ter verrugas verdes prontas para estourar a qualquer momento.
Tirando pela Re, minha melhor amiga desde que me conheço por gente, não tenho
nada de bom desta época.
E mesmo com essa descrição
medonha do que foram meus "anos dourados" decidi acompanhar a Re e
mostrar para todos que eu venci, não uso mais aparelhos, descobri as lentes de
contatos e sim consegui o meu futuro brilhante.
Só que ao passar pela porta da
festa devo ter sido tomada pelo fantasma de anos passados, porque embora eu
saiba que mudei e muito, acho que a imagem que as pessoas vêem ainda é da
menina abridor de garrafas quatro olhos. Que raiva!!!
Vou matar a Re quando isso tudo
acabar.
- Oi tudo bem? te vi entrar,
mas acho que não quer muito papo né, porque não saiu desse canto ainda.
Caramba, não é que pode piorar
ainda mais. Ta na cara que ele não me reconheceu. Lucas o cara mais lindo que
já vi na minha vida, que na adolescência já era maravilhoso e que agora é a
personificação de Adonis. Fui apaixonada por ele nada mais que 4 anos da minha
vida, e ele, nunca me notou, o que eu até agradecia na verdade, preferia sonhar
com um amor platônico do que ser o alvo de piadas do carinha que tinha roubado
meu coração. Então vamos lá respira...
-Oi tudo bem e você?
-Tudo ótimo, sou Lucas. Não me
lembro de você.
-Que bom! - ai caramba não
acredito que disse isso, ainda bem que ele sorriu. - Quero dizer, que bom que
podemos nos conhecer melhor agora né
-Claro, para isso esses
encontros servem na verdade, conhecer pessoas que passaram por nossas vidas em
períodos que eramos idiotas demais para notar
-Você não era idiota. Ícone da escola,
capitão do time, com todas as musas nos seus pés, acho que foi um período bem
interessante para você na verdade!
-Quer dizer que você me conhece
então, e ainda não me disse eu nome
- É verdade desculpa! Sou a
Laura
-Prazer em te conhecer Laura
Acredite, o prazer é todo meu.
Achei que na vida adulta ruborizar estava fora de questão mas acabo de
constatar que não. Sinto como se meu rosto fosse entrar em combustão
instantânea a qualquer momento, e agradeço pela meia luz do salão porque caso
contrário seria obrigada a sair correndo e assinar o atestado de ridícula que
tenho certeza que esqueci em algum lugar.
-Então Lucas, o que você fez
nesses dez longos anos?
-Nossa, falando assim eu me
sinto um velho.
E nesse momento ele sorriu, e
não foi um sorriso qualquer, foi O SORRISO! Aquele com dentes lindos e
perfeitos, com olhos azuis e cílios longos que sorriem também, e que como
resultado desse movimento facial estonteante, surgem covinhas nas bochechas.
Exatamente a cena que me perseguiu por uma vida, e que agora fez reviver a
revoada de borboletas que estavam adormecidas no meu estômago.
- Na verdade sinto como se não
tivesse passado tanto tempo assim Laura. Mas eu fui para a faculdade, cursei
engenharia, morei fora por 3 anos, mas resolvi voltar porque sentia que algo
muito importante teria que acontecer ainda e aqui no Brasil. Coisa de louco né
?
-Não, na verdade acho muito
interessante isso, mostra sua preocupação em resolver sua vida, e de alguma
maneira os assuntos pendentes, sei lá.
-Vai me dizer que você é
psicóloga?- minha vez de sorrir, ou melhor acho que cheguei a gargalhar.
-Não, na verdade sou médica,
residente. Mas sempre ma fascinou a psicologia. Gosto de ler muito sobre isso,
tentar entender os comportamentos. Mas fiz medicina, como meus
pais.
-Humm, você fez o que os seus
pais queriam então?
-Não, eu amo o que faço, mas
era esperado que eu desse continuidade ao legado da família.
-E você é feliz ? Dando
continuidade ao legado da família?
-Sou, sou feliz sim, muito
feliz! -Tomara que meu rosto esteja concordando comigo!
-Não me convenceu muito Laura,
mas vamos deixar esse assunto pesado de perfil vocacional para outra hora. Quer
dançar um pouco?
Dançar? Espera, Lucas quer
dançar comigo? sério ? Como se meu corpo tivesse uma vida independente eu
acenei afirmativamente e em questão de milésimos de segundos estava a caminho
da pista de dança com minha mão entrelaçada a dele.
É claro que o universo conspira
nesse momento, e a música é lenta, do tipo, rostos colados, corpo juntinho e
mãos na minha cintura. Só espero que ele não consiga ouvir meus batimentos
cardíacos, pois tenho a impressão que meu coração bate na boca, como uma
bateria de escola de samba.
Já que estou aqui vou
aproveitar o momento. Sempre sonhei com isso, sentir o perfume dele, ter meu
corpo próximo, sentir a respiração na minha pele. E aqui estou eu, e as
sensações são ainda mais magnificas do que eu sequer sonhei um dia.
Recapitulando, tenho que beijar
a Re por ter me convencido a vir.
Sei que uma música tem em torno
de 4 minutos mas para mim o tempo passou tão lentamente que quando acabou eu
ainda estava perdida no movimento e só voltei a mim quando ouvi o som do alto
falante anunciando que o Rei e a Rainha da festa iriam ser coroados naquele
momento.
Nossa, serio que existe isso
ainda? Rei e Rainha da festa, que coisa mais ridícula.
- E os escolhidos deste ano são
Lucas Vasconcelos e Laura Bittencourt. Aplausos para o casal
O salão rompeu em aplausos
calorosos, o holofote estava focado em nós que ainda estávamos de mãos dadas,
dois professores que me lembro muito bem, colocam as coroas em nossas cabeças e
pedacinhos de papel laminado são lançados, tornando a cena digna de baile de
formatura. Eu não acredito que esta acontecendo isso.
Encontrei um olhar bem familiar
e que estava marejado. Renata minha melhor amiga e confidente mee lançou uma
piscada, dando saltinhos e batendo palmas, como se estivesse muito orgulhosa de
mim. Tenho uma leve impressão que tem um pouco das mãos dela nisso tudo, mas
vou aproveitar, porque sem dúvida foi um sonho de adolescente por muito tempo,
e antes tarde do que nunca vou viver isso.
- Agora o casal vai dançar a
música de coroação. Venham para o centro Rei e Rainha.
Lucas apertou minha mão e me
fez voltar para a realidade, e diga-se de passagem estava tão boa quanto o
sonho. Olhei para os seus lindos olhos azuis e me perdi ainda mais.
-Vamos dançar minha rainha?
-Claro meu Rei
Caminhamos até o centro do
salão e começamos a dançar, e foi ainda mais maravilhoso. Senti os lábios de
Lucas na minha orelha e um arrepio tomou conta de toda minha pele.
-Quando tudo isso acabar, você
gostaria de tomar alguma coisa? Sei lá sair um pouco, o que acha?
Ele está me chamando para sair
? é isso mesmo?
-Claro porque não, eu
adoraria.
-Adorei te rever Laura.
-Me rever, hahaha, você nem
lembrava de mim!
-Na verdade eu lembrava sim,
mas como você sempre preferiu se esconder, achei melhor começarmos do zero. Mas
na verdade eu sempre quis te conhecer, mas você era tão na sua. E como
disse, na adolescência somos tão idiotas que deixamos oportunidades passar.
Ainda bem que estamos em tempo de corrigir né ?!
-Esta me dizendo que você
queria me conhecer quando eu era a Laura quatro olhos abridor de garrafas?
-Não, eu quero dizer que eu
sempre quis conhecer a Laura, garota inteligente, que vivia escondida com medo
que alguém enxergasse toda a sua beleza. Essa Laura sempre me atraiu.
-E porque você não tentou me
conhecer?
-Eu tentei, várias vezes, mas
você fugia de mim. Quando eu me aproximava você jogava os cabelos no rosto, e
dava um jeito de sair rapidinho. Sempre achei que você não ia muito com a minha
cara.
Fala sério, quer dizer que o
rapaz dono do meu coração por anos, queria me conhecer e EU o afastava? Olhei
no fundo dos olhos de Lucas, com toda a confiança que estava escondida em algum
lugar, junto com a garota que fui no passado, respirei fundo e disse;
-Prazer Lucas Vasconcelos, sou
a Laura Bittencourt a garota que sempre quis te conhecer
-Prazer Laura, até que enfim
você veio.
Nossos olhos estavam em
sintonia, até as piscadas pareciam harmoniosas, a respiração estava acelerada,
senti minhas mãos molhadas e frias. Nossos corpos foram se aproximando cada vez
mais.
-Laura, acho que já perdemos um
bom tempo com as inseguranças, e não estou afim de deixar mais nada passar, te
assustaria muito se eu pedisse um beijo?
-Na verdade Lucas, me
assustaria se você não pedisse.
É possível uma garota de 28
anos que já beijou antes, viver seu primeiro e tão sonhado beijo? É sim, e
posso dizer com toda a certeza, valeu muito a pena esperar por dez anos. "
Ana Mel
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